Uma vez, muito tempo atrás, participei de um campeonato de três xis três que se destacava por premiação interessante, em uma famosa loja de esportes que leva o nome de uma figura mitológica. O importante é que o dia tava iluminando, e chegamos na final. Pra um adolescente confiante na sorte, nada poderia alterar o destino já cravado, e algumas centenas de reais que seriam de muita importância naquele momento.
Na finalíssima, me deparei com um sujeito alto e magro, com braços enormes e pinta de jogador. Ao seu lado, uma dupla de gêmeos que já conhecia, não jogavam basquete, eram do futebol. Além disso, descobri que tinham chegado na final sem o terceiro elemento, com direito a WO de oponentes e partidas de nível duvidoso. Assim, imaginei ser impossível que esse trio em questão, pudesse oferecer mais perigo do que outros times que enfrentamos até aquele momento. E nos primeiros minutos, tive razão.
1 a 0; 3 a 0; 4 a 0; 5 a 0, e essa avalanche chegou aos dois dígitos: 15 a 0. Ali, com vantagem de sete posses e com um adversário que dava risada e conversava com os espectadores, imaginei que era meu dia de sorte. Pensando bem, o deboche do outro time devia ter ligado meu alerta. Bom, não ligou, e sem qualquer expectativa de ser derrotado ajudei o drive de um dos gêmeos; li certo o passe no corner; cheguei em cima no closeout; mordi um jab pro garrafão; tomei o corte pro fundo; quis recuperar e contestar o ataque ao aro; vi aquele que tinha ginga de atleta subir mais que a bandeja; me arrependi; tomei uma enterrada na cabeça. 15 a 2, ou 15 a no placar moral.
Dali em diante, foram 20 pontos seguidos desse tal mutante que me via tendo que defender. Foi bola de seis passos atrás da linha; bandeja de mão trocada; mais uma enterrada ou outra; lance livre após frustração minha… Todo tipo de cesta. Com risada no rosto, ele matou o jogo. Acabou que nem pegou o prêmio, deu um abraço nos amigos e foi embora. Moleque como sempre foi, e mais ainda aos 17 anos, deu show em um campeonato meses antes de sua primeira convocação pra Seleção de Base. Não sabia exatamente quem era, mas tinha jogado contra um craque de outra esfera. Tinha tomado um poster de Daniel Onwenu.
Anos depois, se tornou joia corinthiana protagonista com 17.1 pontos por jogo e 5.8 rebotes de média na LDB Sub-21, e primeira grande estrela da base alvinegra ao lado do comandante Vitor Galvani. Nessa época, gravei alguns muitos jogos seus; fotografei vitórias zebráticas do timãozinho; conversei sobre o episódio acima; e vi a mesma risada algumas outras vezes.
Tempo depois, Daniel chegou a declarar pro Draft da NBA de 2023 e teve excelente passagem no Adidas EuroCamp. Mas fora dos sessenta da classe, retirou seu nome e voltou pro Timão. Fez temporada de 7.6 pontos e 4.0 rebotes em 22.3 minutos no meu time do coração, e me fez feliz. Mesmo sem o salto esperado no NBB, foi destaque em estreia pela Seleção Brasileira com jogo de 13 pontos e 100% de arremesso, e decidiu se distanciar do mercado brasileiro. Ficou meses treinando; trocou de agente e disse que ainda mirava o topo do mundo.
Daniel e o Capitanes já namoravam há algum tempo. Na época de Galvani na comissão técnica mexicana, houveram rumores de um segundo capítulo entre o treinador brasileiro e o melhor jovem que comandou no Parque São Jorge. Sem Galva por lá, os rumores eram de Dani no México logo após o NBB, coisa que não se concretizou. O que aconteceu foi um convite do Mexico City Capitanes, agora em Outubro, para o recorrente Try-Out entre latinos.
Daniel foi bem, precisava ir bem. Apostou tudo em uma semana de eye-test gringo, com certeza que faria valer a viagem. Conheço bem a fera e te garanto ser impossível a confiança falar baixo nesses momentos, costuma planejar a vida nesse ritmo. E assim, com risada no rosto em fotos divulgadas pelos mexicanos, deve ter trazido o mesmo sentimento pra eles. Afinal, assinou com os caras, jogará a temporada pela franquia que introduziu Mãozinha à NBA, e sonha com mesmo destaque na liga de desenvolvimento de lá. É oficialmente jogador de basquete na G-League da NBA!
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